EDITOR : ALEXANDRE FRANÇA
COLABORDORES : ANDRÉ REIS E BETH SHIMARU

quinta-feira, 14 de junho de 2012

"Caminhando..."

por Ingrid Assis P. de Oliveira.

Paris. Capital da França. O país da Torre Eiffel, construída em 1889 em uma exposição universal para homenagear os 100 anos da queda da Bastilha.

Paris. Cidade Luz. Onde fica a Torre Eiffel, o Museu do Louvre, a Catedral de Nôtre-Dame e o Arco do Triunfo, entre outros tantos pontos turísticos e patrimônios da humanidade.



Quero falar de Paris. Mas resolvi falar da Paris que conheço, da cidade que a cada visita, cada caminhada, sinto vontade de não ir embora nunca mais. A cada ida, sinto-me surpreendida . Surpreendida, como não me sinto com as novidades do dia a dia ou da ciência e tecnologia.




Paris, do cheiro amadeirado de tabaco nos cafés. Mesas e cadeiras apertadas. Sentar ao ar livre no frio. Sopa de cebola e um pão meio borrachudo, até. Delicioso. Um cão dormindo embaixo da mesa vizinha. Beber água com gás na garrafinha, com canudinho. Crème Brulée.




Ah, Paris… onde as pessoas andam com uma baguete com queijo brie embaixo do braço. Sentam-se em um degrau à beira do Rio Sena, em um canto de alguma ponte, onde houver um espaço verde qualquer. Deitar na grama fria e levemente úmida. Quem sabe até um pequeno cochilo ao ar livre.




Onde as pessoas falam baixinho, com seu idioma de som tão aveludado e são naturalmente charmosas. Gostam de moda na sua essência mais frívola e ao mesmo tempo identificadora do sujeito. Paris de Serje Gainsbourg, com seu imenso nariz e charme irresistível. Das mulheres de porte, de seios pequenos e de quadris e bumbuns proeminentes. Mulheres marcantes por um despojamento milimetricamente planejado. Fêmeas de beleza sutil, sensualidade implícita. Catherine Denevue, Brigitte Bardot. Presença.






Não há sensação mais deliciosa que voltar a pisar nas ruas de Paris e caminhar. Caminhar sem rumo, sentindo o vento gelado no rosto, entrando nos cabelos, ao mesmo tempo que um solzinho gostoso acalenta a alma. Perder-se. Na arquitetura, nas artes, nos parques, jardins, praças, pessoas, locais, no tempo. Não conseguimos definir ao certo o tempo, a época. Paris: cidade atemporal.  Fora de qualquer script.




Montmartre, uma das regiões mais interessantes da cidade, é tomada pela nostalgia, pela arte. Foi a meca dos principais artistas, escritores, poetas, discípulos e boêmios no final do século 19. Reduto dos principais cabarés, bordéis e festas noturnas intermináveis.





Vários artistas se renderam à boemia e atmosfera de Montmartre e passaram parte de suas vidas lá. Seja morando ou frequentemente visitando. Modigliani, Salvador Dalí, Toulouse-Lautrec, Vincent Van Gogh, Oscar Wilde, Pablo Picasso, Leon Trotsky, Rudolf Nureyev, Roman Polanski, Josephine Baker, Marlene Dietrich, Hemmingway, Proust, Luiz B˜unuel, Gertrud Stein, Cole Porter…

Atualmente, a vida noturna perdera suas características, a maioria dos artistas se mudaram. No entanto, ainda hoje, ao se deparar com o Moulin Rouge, é inevitável  lembrar das obras de Toulouse-Lautrec  e imaginá-lo em meio ao cabaré. Registrando e eternizando o frenesi do local e até mesmo o olhar vazio de uma prostituta ou outra.





Durante o dia, Montmartre mescla seus charmosos cafés e lojinhas de souvenirs a bancas vendendo frutas e legumes em suas ruelas estreitas. As pessoas lêem um jornal, um livro. Numa mesinha apertada de algum café ou escorado em algum poste. Automaticamente, vem em minha mente o mundo mágico e simples de Amélie Poulain. E enquanto se caminha pelas ruas, é possível até mesmo escutar a música instrumental tipicamente francesa, no acordeão, de Yann Tiersen.




Quartier-Latin. Livrarias, cinemas, cafés e clubes de jazz ocupam o antigo bairro, às margens do Rio Sena.  Outro bairro que sempre foi associado a intelectuais, artistas  e à vida boemia. Dominado pela Sorbonne, historicamente marcado pelas agitações políticas e pelas revoltas estudantis de 1968. Brilhantemente retratado por Bernardo Bertolucci, em Os Sonhadores.




Depois dessa época, parte do bairro estava tomada por lojas e lanchonetes decadentes. Hoje o local se encontra tomado por designers, jovens artistas, cafés descolados, salões de beleza hipermodernos, brechós fascinantes e limpos, pessoas de espírito jovem, elegantes e simpáticas.




A região transformara-se em um local lindíssimo e moderno, tornando-se reduto GLS, frequentada e habitada pelos chamados hypsters e livres de espírito. Crianças pequenas com seus gorrinhos brincam felizes enquanto suas famílias batem papo, beliscando algum petisco natureba ou tomando algo inusitado, como um smooze de tomate.




Outra parte do bairro abriga livrarias caóticas, como a Shakespeare & Co Kilometre Zéro Paris, onde é possível achar-se qualquer tema, qualquer escritor que se possa imaginar. Dos antigos ao contemporâneos. A loja é minúscula. Ouve-se o rangido das tábuas de madeira do chão e das escadas. Em alguns minúsculos cômodos da loja não é possível ficar totalmente em pé, mas há poltronas empoeiradas para os clientes sentarem. Também há um pequeno cômodo escuro, onde mal se enxerga coisa alguma; é onde os preciosos livros raros ficam armazenados. O cheiro de livro velho predomina e inebria os amantes da leitura.




Atravessando a Ponte St. Michell, de Quartier-Latin, chega-se em Île de La Cité. Onde já foi centro de poder, mas que hoje em dia somente a religião continua presente. Atrai turistas pela imponente Catedral de Nôtre-Dame. Atravessar a “ilha” para chegar à outra margem do Rio Sena faz-nos passar por ancoradoures, cercados de árvores, muito charmosos e pitorescos. Se começar a chuviscar o melhor lugar para se proteger é embaixo das copas das árvores, sentado em um banco de madeira.  As chuvas de primavera de Paris são curtas e deliciosas.

Chegando à Pont des Artes vêem-se os cadeados presos a seus arames. Os cadeados simbolizam o amor mútuo. Pela lenda, o casal que prender o cadeado alí e jogar as chaves nas águas do Sena ficará para sempre junto. Deve-se escrever os nomes do casal no cadeado, escolher um lugar nas grades da ponte, prender e lançar as chaves ao Senna. Amores. Cadeados(?).





Melhor mesmo é voltar a caminhar pelas margens do Sena até chegar a St.-Germain-des-Prés. Passar pelos velhos quiosques cheios de coisas velhas à venda. Velhas não, vintage; e também retrô. Posters da Belle-Epoque, cigarrilhas de prata, livros usados, ilustrações antigas, souvenirs…  Pode-se ficar horas olhando as mercadorias, artistas e pessoas. Mas em Paris o tempo não importa, e a chuvinha gostosa que vai e volta faz parte das melhores sensações que a cidade oferece.





E essa Paris não estaria completa se não citarmos Le Marais. Uma das áreas mais fascinantes de Paris. As ruas são cheias de vida, repletas de galerias, restaurantes, butiques e centros culturais. Impressiona a diversidade cultural e a mistura étnica de judeus, argelinos, asiáticos e outros.




Aos domingos, há diversas apresentações musicais pelo bairro. Música clássica e jazz predominam. Tive o privilégio de conhecer em uma ruazinha dessas, “Richard Miller’s Riverboat  Shifflers”, um conjunto formado por jovens senhores com seus 80 anos. Fantásticos. Principalmente pela presença encantadora de Madame Madaleine, a alma do conjunto! A elegante e bela senhora sapateia e dança ao som do jazz como nunca havia visto antes.





Pego-me imaginando como viveram durante todos esses anos em Paris. Chego a pensar que o passado talvez tenha sido uma época melhor. Saudades de um tempo que não vivi… Caio em mim. Madame Madaleine vive o hoje. Seus olhos cheios de brilho e sua alegria contagiante, não vivem no passado. Vivem o hoje.




Um comentário:

  1. Achei diferente o seu texto, como o modo com que você dispõe as frases... Não sou nenhum cult, mas apreciei a sua escrita.

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