EDITOR : ALEXANDRE FRANÇA
COLABORDORES : ANDRÉ REIS E BETH SHIMARU

quarta-feira, 20 de fevereiro de 2013

"Qual a sua ideia de sofisticação?"

por Rejane Paiva

http://www.quimica.net/emiliano/a_quimica_do_vagalume/familia_vagalume.gif


Eu achava esses versos de "Por causa dessa cabocla" (Ary Barroso e Luiz Peixoto) cheios de um lirismo comovente:

"Na noite dos seus cabelos,
Os grampos são feitos de pirilampos
Que às estrelas querem chegar".


Pensava que o poeta conseguira encontrar uma linda imagem onírica para cercar a sua cabocla daquela aura feérica que só os apaixonados podem enxergar. Até que encontrei a seguinte descrição em "A vida em flor de Dona Beja", de Agripa Vasconcelos:

"O salão regurgitava de convidados, cada qual mais solene em sobrecasacas, redaques e vestidos galantíssimos. Parlavam com graça, falavam honrados pela distinção dos convites, todos eufóricos à força dos licores estrangeiros. Chegavam outros convidados. Ninguém vira ainda a dona da casa.

De repente entrou Beja; caminhava majestosa. Apresentava-se com vestido verde de decote baixo e larga cinta de seda grená mal atada. Seus carpins eram também verdes, com fivelas de ouro e diamantes. Via-se-lhe na altura do coração, grande cintilante broche de diamantes cor-de-rosa. Uma vaporosa boina de renda frouxa, ainda verde, lhe envolvia a cabeça bem posta no pescoço branco. Debaixo dessa boina, em saquinhos pequenos de crivo de seda alva, moviam-se, presos, vários vagalumes de luzes amarelas, verdes, azuis. Quando ela movia a cabeça, naturalmente, viam-se-lhe as luze dos lampírios, luciluzindo nos cabelos.

Todos a receberam de pé, com um oh, de surpresa; pareciam ver uma sultana saída das Mil e Uma Noites."


Alguém aí consegue imaginar uma cena como esta?!!! Que requinte de Dona Beja em arranjar os cabelos com estes bichinhos luminosos! Existe ideia mais bonita?! Fiquei maravilhada e até em dúvida se isso seria meramente ficção ou se tal seria exequível. Mas o autor continua, descrevendo o estado de espírito de Beja no final da festa:

"Beja chorava e ria, com o penteado em desalinho, cabelos onde brilhavam lampírios. Com tantos abraços, sufocara-se, sentindo mal-estar.
Só ela sabia ser aquela a última festa a que assistia no Palácio do Ouvidor.
Eram 3 horas da madrugada."

Não resta dúvida: dona Beja enfeitara mesmo os cabelos com pirilampos. Encontro nas notas o seguinte esclarecimento:

"Vagalumes nos cabelos - uso de antanho, muito requintado. Moças usavam-nos como enfeite, nos bailes noturnos, dentro de saquinhos de rendas finas, disfarçados nos cabelos, ou soltos, contidos por uma coifa que envolvia a cabeça."

Aí está algo que eu não tinha o menor conhecimento. E o mais interessante foi encontrar a descrição num livro tão importante para todos nós do Triângulo Mineiro, que conta a história da incontornável figura da Dona Beja.


Parece incrível, mas trata-se de um hábito do séc. XIX, que nem foi inventado pelo autor do livro, e muito menos pelos autores da música.

E eu que pensava que sabia o que era algo sofisticado... Não, na verdade eu não tinha a menor ideia. As moçoilas de dois séculos atrás me deixaram estupefacta. E vc? Conhece algo assim tão sofisticado?



Um comentário:

  1. Querida Rejane, fica aí uma sugestão para o seu recital em Uberlândia, digno de um retorno triunfal!! Bjs Fernando Narduchi

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