EDITOR : ALEXANDRE FRANÇA
COLABORDORES : ANDRÉ REIS E BETH SHIMARU

quinta-feira, 1 de maio de 2014

"A Capela de Matisse"

por Alexandre França


Concebida nos mínimos detalhes por Henri Matisse, mestre do Fauvismo, grande movimento artístico da Arte da primeira metade do século XX, a Capela do Rosário, em Vence, França, é antes de tudo um lugar de recolhimento.



Acompanhe sua “história de construção” pelo texto do francês Dominique Gerbaud com tradução de Rui Martins.


“Quando o trabalho foi concluído, a irmã dominicana Jacques-Marie pressentiu que a capela arriscava-se a não “passar”. Que o caminho da cruz era de uma rara violência, os desenhos eram demasiado sóbrios para uma igreja, o altar voltado para a assembleia.



Estamos em 1951. O Concílio ainda não tinha sido anunciado. “E porquê o seio?”, perguntou ela a Matisse. “É para mostrar a maternidade da Virgem, sem a qual ela não teria razão de ser”, respondeu-lhe o mestre. “E porquê a violência do caminho da cruz?” “Porque é um drama, minha irmã. Tudo se enovela e acontece a grande velocidade.”



A irmã Jacques-Marie, que tinha pedido a Matisse alguns dias para “digerir” a obra, só ficou meio convencida. No entanto não vai demorar muito tempo para amar profundamente esta capela. Um pouco porque respeita o mestre e partilha com ele uma profunda cumplicidade, mas sobretudo porque seguiu, compreendeu e partilhou a sua evolução renovadora. Em pouco tempo compreendeu tudo. Mas pressentiu que seria necessário explicar as escolhas do mestre e, ao tempo, não havia especialistas em comunicação. Sobretudo neste domínio.


E aquilo que ela temia, aconteceu. A revolucionária capela é mal recebida. O modernismo foi difícil de aceitar. “Muitos visitantes insultavam-nos e não se poupavam a expressá-lo no livro de honra. Houve mesmo algumas manifestações na capela; conseguimos restabelecer a calma, mas não sem consequências”.




O tempo passou e todos esses acontecimentos foram esquecidos. A capela atrai hoje 70 mil visitantes por ano. Para uma grande maioria, é o encantamento. “Há pessoas que choram ao entrar”, conta a Irmã Myriam, responsável da comunidade das Dominicanas do Rosário, proprietária do lugar. “É uma emoção que não é apenas artística. É a modéstia da capela, a sua simplicidade, a sua extraordinária limpidez; tudo isso tem um forte impacto em certas pessoas.”


Constata-se hoje que Matisse ganhou a sua aposta porque, como referia um visitante, “a simplicidade do lugar leva a meditação.” “É de tal maneira simples que é belo”, diz outro. Um terceiro sublinha a “sinceridade” do lugar: “era preciso que ele acreditasse para fazer desta fora”. E todos insistem no jogo das cores, na predominância do azul que confere uma ligeira impressão violeta aos muros brancos de uma das arestas.



Para os vitrais, Matisse escolheu três cores. O verde e o azul transparentes. Verde da vegetação, azul do mar e do céu para evocar a criação. O amarelo, por seu lado, é opaco. Ele não deixou escapar nada. Porquê? Porque o amarelo de Matisse é a cor do sol, e o sol é a luz. E a luz é a imagem de Deus, este Deus que não podemos ver com os nossos olhos.



Este jogo de luz, estes reflexos sobre os muros brancos dão, num espaço muito limitado, a ideia de imensidão. “O papel da pintura”, dirá Matisse, "é o de alargar as superfícies, de fazer com que deixem de se sentir as dimensões do muro. Eu apenas disponho de um pequeno espaço mas quero dar-lhe uma dimensão infinita”. Foi um desafio conseguido. A capela não tem senão cinco metros de largura sobre quinze de comprimento, mas não há a impressão de se estar fechado, muito por causa dos muros brancos e das cores que mudam ao longo do dia e das estações. A perfeição das formas anula as dimensões do espaço e os reflexos dos vitrais sobre as cerâmicas reluzentes animam a capela. Tudo é repouso e quietude.”

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